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...são necessárias para se chegar a uma resposta?

19.2.07

Labirinto do Fauno

Assisti ao filme ontem, com meu irmão e sua namorada, e gostei muito. Fora o fato de que era dirigido pelo Guillermo del Toro e que estava concorrendo ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, não sabia muito mais sobre a produção. Achava que se tratava de uma história para crianças... Esse é, na verdade, um conto de fadas para adultos, uma fabula de duas histórias, em cuja beleza de uma contrasta com a escuridão da outra.

Antes de entrar na história, um breve comentário sobre o diretor. Faz anos que vi a "Espinha do Diabo". Gostei bastante, principalmente por ser um desses filmes que se destaca do contexto em que foi produzido e por agregar uma agenda totalmente diferente ao gênero ao qual se encaixa. As crianças, o orfanato (ou será conservatório, nem lembro mais...) e o terror como irmão do drama – uma mistura realista, intimista e honesta. É verdade que "Hellboy" não agradou a todos, fãs e aversos de quadrinhos tiveram opiniões diversas e nem sempre favoráveis. Mas supera de longe essas produções que investem num show de efeitos especiais e deixam de lado o fluxo da história (ainda que nesse caso não houvesse tanta história mesmo).

O elo entre os três filmes é a temática fantástica/fantasiosa e o predomínio do campo da imaginação ("Em 'Hellboy' também???" - é, principalmente em "Hellboy", pois esse é um filme que não se degusta sem muuuuuita imaginação). Na "Espinha...", a imaginação aparece como elemento cimento de uma realidade dissociada. O fantástico preenche as lacunas, pune os criminosos e oferece sentido e salvação aos que o fazem por merecer. "Hellboy" é uma versão mais infantil dessa analogia, pois é uma filme de ação E um filme de super-herói - que mais esperar?

O "Labirinto...", em compensação, consegue manter separadas as trilhas da realidade e da imaginação, ambas correndo em paralelo ao longo do filme inteiro. A viagem de Ofélia pelo mundo do Fauno é uma construção impecável, porém cuja veracidade não nos é oferecido sob nenhuma perspectiva além da dela própria. A atmosfera sombria que compõe o microcosmos da história, em compensação - a luta entre o exército e os rebeldes, a barbárie mal contida do seu padrasto, a fraqueza da mãe ante uma gravidez difícil ,- é imponente, e contextualiza inclusive a fábula da "princesa do submundo".

Quem ver o filme vai entender que a brutalidade do mundo exterior é de fato chocante (com direito a uma cena que me lembrou o início de "Irreversível", nada, nada agradável...). Essa atmosfera põe em relevância as cenas de beleza da trama fantástica e atenua o terror subjacente à jornada imposta pelo Fauno, mas não prova a existência de magia ou de fadas.

Lembro de um comentário que certamente teria de ouvir da boca de uma certa ex-namorada minha: "Bah, não gostei. Tudo que ela fez foi alucinar o filme todo! Tu não acreditou em nada daquilo, né?". Não sei, não sei. Acho que o trunfo do filme é deixar essa possibilidade alucinógena em aberto, mas criando espaço com seus pequenos mistérios para que Ofélia tenha realmente vivenciado aquele universo de sonhos.

Ainda que tenha tudo sido falso, como não se encantar com o triunfo da imaginação diante de um mundo assim tão obscuro? O que importa, no fim das contas, é que ela acreditou, que foi atrás desse mundo surreal e nele encontrou sua realização.

3 Comments:

At terça-feira, fevereiro 20, 2007 2:18:00 AM, Blogger M.R. said...

Vi o filme semana passada. Acho que todo mundo que viu ¨Irreversível¨ sentiu o mesmo flasback naquela cena – eu, pelo menos, fiz a associação imediata. Confesso que, em alguns momentos, cheguei a virar o rosto com medo do que viria, como na hora em que o médico tem que amputar a perna de um cara.
De qualquer maneira, gostei do filme. Tanto pela fantasia sombria como justamente pela dúvida que oferece. Porque, na verdade, parece que a resposta não importa...

 
At segunda-feira, fevereiro 26, 2007 10:31:00 PM, Blogger Álvaro Lima said...

A resposta importa porque ajuda o espectador a definir a si mesmo. As interpretações das histórias possíveis permitem perguntar o que é, o que não é, e quem somos diante de tudo aquilo.

 
At terça-feira, fevereiro 27, 2007 6:33:00 PM, Blogger M.R. said...

Acho que a gente tá falando de ¨respostas¨ diferentes :P ou eu não me expressei direito. Não é que a resposta não importe. Pelo contrário. O que não importa é o fato de o filme não oferecer explicitamente alguma. Ai, consegui explicar?

 

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