Quantas perguntas?

...são necessárias para se chegar a uma resposta?

28.1.07

A perda da essência

Ouço o farfalhar das folhas e me pergunto de onde vem...

Me pergunto se é realmente possível um ruído tão íntimo em um mundo tão grande, em um universo de proporções assim desmedidas. Se sou o único a escutá-lo, a me deiar envolver por sua natureza, será que ele existe mesmo? Como esperar que alguém acredite em sua beleza indescritível, se não a tiver experimentado por conta própria? Penso então em um poema que quero escrever, mas não posso – ou pelo menos não devo. Quem haveria de lê-lo, decifrá-lo? Quem haveria de entender que esse poema...

Me levanto e vou em direção ao som. A copa das árvores dança elegante por sobre a luz amarelada dos postes, projetando em minha janela um espetáculo de sombras e silhuetas caóticas. Por alguns segundos, deixo de lado todas as perguntas diante da beleza que vem de fora. Deixo de lado todo o resto, inclusive a mim mesmo.

No conforto desse estado dormente, esqueço momentaneamente que deve haver um porquê. Esqueço que busco uma resposta, um sentido, e me deixo inundar por palavras que escorrem dos meus dedos feito lágrimas. Justo eu, que quase nunca choro... Leio e vejo que escrevi o poema: claro, limpo, puro.

Tento lê-lo em voz alta, deixar que deslize por sobre minha língua para sentir a forma dos seus sons. Paro. Começo de novo e paro outra vez. Aqueles sons travam na minha garganta e emudecem, me queimam por dentro e fazem calar. Não são mais meus dedos que choram.

Trato de apagá-lo do papel, da memória, e então lembro da pergunta. Lembro que a vida existe feito um enigma ou um labirinto, e que assim deveria existir esse poema. Deixo de lado as soluções e o discurso direto, reescrevo tudo até confundir a mim mesmo.

Quem seria capaz de comprender a resposta sem conhecer a pergunta? Quem mereceria contemplá-lo sem antes saber de onde vinha? Quem seria capaz de entender que aquele poema era...

Ouço o vento soprar novamente na copa das árvores e volto com o jogo de luz e sombras ao qual estamos acostumados. Escrevo o mistério, renegando o prazer masoquista de compartilhar a solução. Espalho as peças do quebra-cabeça, minto sobre as regras do jogo, escondo as chaves. Ainda assim, torço para que alguém além de mim seja capaz de entender. Mas já não espero nada.

Afinal, quem poderia entender que aquele poema era...

2 Comments:

At segunda-feira, janeiro 29, 2007 12:19:00 PM, Blogger lu castilhos said...

"Deixo de lado todo o resto, inclusive a mim mesmo"...

Eu simplesmente AMEI isto.

Este texto aí já é um poema.
Adorei
:*

 
At quarta-feira, janeiro 31, 2007 9:50:00 PM, Blogger Álvaro Lima said...

Obrigado! Fico feliz porque escrevi imaginando que faria o teu estilo. Aproveito para avisar o Ítalo: o poema em questão não era uma bicha louca!

 

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